Meu interesse de ler O Livro Tibetano dos Mortos foi o mesmo que tive ao procurar o Dao De Jing (Tao Te Ching), o Bhagavad Gita, o Corpus Hermeticum, ou seja, a intenção de conhecer os trabalhos escritos das doutrinas em suas fontes. Este livro seria então para mim a fonte do conhecimento budista tibetano. Mas não foi bem assim…
Evans-Wentz foi um antropólogo e pesquisador norte-americano e ele é o responsável pela tradução para o inglês e organização do O Livro Tibetano dos Mortos, ou Bardo Thodöl, como é conhecido no oriente. O Bardo Thodöl é um conjunto de manuscritos muito antigos, portanto, o trabalho do autor foi feito com o apoio da versão do Lama tibetano Kazi Dawa-Samdup. O livro, portanto, é uma montagem/organização dos axiomas do Bardo Thodöl.
A leitura deste tipo de material é tão complexa que é necessário um volumoso conteúdo de introdução e prefácios. Um dos colaboradores, inclusive, é o famoso psiquiatra e pesquisador Carl Jung. Esta fase introdutória do livro consome metade do volume total da obra, mas realmente é necessária devido às nuances e particularidades que possui a doutrina budista tibetana.
Inicialmente, pensei que encontraria no livro uma dissertação acerca da cosmogonia tibetana a partir da ótica budista, com seu panteão de divindades, dogmas, filosofias, axiomas, mas o que encontrei foi um texto que já se refere a isso, ou seja, partindo do princípio que o leitor já possui este conhecimento. Desta forma, a leitura torna-se difícil e algumas vezes cansativa.
Em resumo, os ensinamentos do Bardo Thodöl servem para o encaminhamento dos recém falecidos, ou seja, existe um ritual tibetano onde os mestres realizam o Bardo Thodöl ao lado do corpo do desencarnado e ali proferem palavras de “salvação” e orientação do espírito, algo com um aconselhamento pós-morte para a pessoa que deixou este mundo material. Dependendo da envergadura espiritual do falecido, este processo ritualístico pode demorar vários dias, com o mestre ao sopé do defunto a lhe proferir orientação.
Os tibetanos dividiam as esferas superiores da existência em planos, ou Bardos, que são os mundos para onde os espíritos são levados de acordo com seu perfil psíquico e energético. Se o morto é alguém espiritualmente ignorante e foi uma pessoa não virtuosa, este tende a ficar em Bardos mais pesados e ter dificuldade em passar de imediato para um Bardo mais sutil. Se o espírito é bom e virtuoso, a tendência é que seja naturalmente transportado para Bardos mais elevados dos planos de existência extrafísica.
Desta forma, os capítulos da obra descrevem os Livros explicando as características de cada Bardo e o esforço psíquico que os recém desencarnados precisam fazer para transitar nestes espaços e conquistar o plano mais sutil. Na tradição tibetana, o mestre lê o Bardo “ao pé do ouvido” do morto para lhe orientar na vida pós morte. Ele literalmente lê e em voz alta os textos através de rituais na casa do defunto ou no local de sepultamento. E isso pode durar vários dias.
As orientações são, em sua maioria, sobre a forma como espírito deve se comportar no momento do desencarne e na transição entre Bardos, ou seja, luzes e sons com os quais deverá se guiar, que tipo de pensamento e sentimento deve ter para uma passagem tranquila, quais as entidades e divindades que encontrará pelo caminho e outros detalhes que fazem com que sua jornada para os Bardos superiores a melhor possível.
Algumas coisas que me chamaram a atenção na leitura:
– O ensinamento budista tibetano fala que os espíritos menos virtuosos, ou pessoas ruins e egoístas, tendem a se refugiar nos Bardos inferiores e mais densos da existência, o que dialoga com a esfera do umbral na cultura espiritualista ocidental. Ou seja, espíritos que tiveram problemas em sua encarnação por terem dado maior valor ao ego e terem em vida se dedicado a ações desumanas e não evolutivas, são endereçados a planos de existência inferiores, ou umbrais.
– O Bardo informa, e aqui eu achei uma questão super curiosa, que tais espíritos em situação umbralina, ou seja, de Bardos inferiores, possuem ainda uma conexão muito forte com as coisas da matéria densa, como vícios, gula, apetite sexual exagerado e outras mazelas; e que este desejo faz com que seu espírito seja puxado magneticamente para um ventre, para reencarnação iminentemente automática. Contrapondo o fato de que nos planos superiores esse processo é feito através de projetos bem estruturados de reencarnação, e não de forma automática em qualquer útero fecundado magneticamente “próximo”.
– Por fim, ainda na questão da reencarnação automática, estes espíritos mais densos nasceriam com caraterísticas animalizadas, o que é uma alegoria do budismo tibetano, ou seja, a pessoa nasce porco, nasce cavalo ou galinha… mas muita gente lê estes textos e pensa que o ser humano nasce animal como uma mora por seus pecados anteriores, quando na verdade isso é apenas uma metáfora onde cada animal possui uma característica marcante ruim na personalidade daquele espírito que irá reencarnar, ou seja, cada animal é uma representação simbólica do erro ou personalidade marcante que aquele espírito teve anteriormente.
– Para os processos de reencarnação, o Bardo considera que o planeta é dividido em espectros de diferentes experiências, de acordo com o lugar onde se nasce. Ou seja, dividindo o planeta em pontos cardeais, sendo norte, sul, leste e oeste, os reencarnados teriam condições de escolher que tipo de experiência de vida pretendem ter de acordo com a região de nascimento. Os pontos cardeais, no entanto, também são uma metáfora e não a localização geográfica dos países no globo.
pedro@meditecomigo.org
Pedro tem background em tecnologia da informação e é bacharel em fotografia. É astrônomo amador, amante da natureza e aprendiz eterno da espiritualidade. Universalista convicto, é leitor de temas como física quântica, doutrinas orientais, Conscienciologia, ocultismo, cosmogonia, ufologia e meditação.
Clique aqui para ver todos os posts de Pedro.
Seja avisado de novos resumos. Em média 1 ou 2 livros por semana. Sem propaganda, nem bate-papo. Saia a qualquer hora.
Seja avisado de novos resumos. Em média 1 ou 2 livros por semana. Sem propaganda, nem bate-papo. Saia a qualquer hora..