Existem diversas histórias e fábulas por trás da origem das escrituras do Dao De Jing (ou Tao Te Ching). A começar pela própria existência de Laozi, seu suposto autor. Há pesquisadores que defendem que Laozi sequer existiu, sendo a obra um compilado de versos e poemas diversos sobre o Dao (Tao) elaborados por sábios e sacerdotes chineses. Outros dizem que Laozi realmente existiu, viveu por volta de 600 a 500 a.C. numa aldeia chinesa do feudo de Chu.
O Dao De Jing é o texto base do taoísmo, assim como a Bíblia Sagrada o é para os cristãos, ou o Torá para os judeus e o Alcorão dos muçulmanos. Temos aqui, no entanto, uma diferença fundamental entre estas obras e informo de antemão para evitarmos uma comparação indevida: o Dao De Jing não é messiânico.
Enquanto os outros textos sagrados discorrem, cada um ao seu modo, sobre uma figura suprema humanizada como um rei ou um líder, apontando regras, costumes e histórias heroicas, ditando dogmas e convenções para um grupo de pessoas; o texto de Laozi é mais como um aconselhamento de boas práticas e virtudes, citando sempre o Dao como uma inteligência insípida e sem dar nome aos bois. Essa é beleza do Dao De Jing: a própria escritura reflete a fluidez e abrangência do conceito do Dao. Autocontido, como se a galinha nunca tivesse saído de dentro do ovo, e mesmo assim é galinha.
Me surpreendeu também o fato de termos textos diretos, sem muitos aforismos. Mas antes de prosseguirmos, vamos comentar sobre o perfil estrutural da obra. Após uma extensa introdução para calçar o leitor, o Dao De Jing é separado em quatro blocos de escrituras que são os Quatro Rolos, todos atribuídos à Laozi. Cada rolo conta com vários versos que compõem um poema, os capítulos. O texto original em chinês desta edição vem acompanhado da tradução de Giorgio Sinerdino, pesquisador brasileiro que vive em Macau há vários anos. Cada parágrafo dos versos aparece então em mandarim moderno, seguido da tradução logo abaixo, e também dos comentários do Senhor às Margens do Rio. Ao final do livro, há uma melhor explicação de quem foi o Senhor às Margens do Rio, mas basicamente ele é um sábio que comenta em cima dos versos originais de Laozi. Ou seja, o Dao De Jing só faz sentido e é inteligível mediante estes comentários. Caso contrário, o texto não seria corretamente compreendido.
“
– 復衆人之所過,
Reverte os excessos da multidão.
”
Para melhor contextualizar e explicar diversos aspectos de época e dos costumes da sociedade chinesa, Giorgio monta um bloco de Notas sempre após um poema (capítulo). O leitor pode optar por não ler as Notas, pois elas não fazem parte do original; mas a leitura delas leva a um melhor entendimento quanto à aspectos particulares do taoísmo e do sistema político feudal da época.
Por falar em feudal, o texto é repleto de referências à senhores feudais, clãs, conflitos armados, camponeses subjugados, pois essa era a realidade na época em que a obra foi escrita. No entanto, à medida que o leitor se aprofunda livro adentro, percebe como as lições servem perfeitamente para os dias de hoje.
Laozi fala sobre aspectos da vida humana que são atemporais, como a soberba, o orgulho, a cobiça, o poder, a leveza, a humildade e a sabedoria. Discorre bastante sobre as falhas dos governantes na administração de seus povos, e isso explicaria a infelicidade e ignorância coletiva. A linguagem tenta ser a mais simples possível, e através de conselhos e ensinamentos, trilha o caminho do Sábio para o bom aproveitamento de uma encarnação no mundo material. Faz um paralelo sobre que tipo de mundo poderíamos esperar caso os governantes fossem sábios e praticassem o Dao. Laozi fala de governantes e vilas, mas isso tem um duplo sentido, significando também o nosso governo de nossa própria vida e corpo físico. Por se tratar de verdades supremas, o texto não se torna defasado.
O autor está constantemente citando, mas não tentando definir o Dao; e como se trata de algo impossível na essência, termina a sua obra sem defini-lo ao certo. Um dos ensinamentos taoístas é justamente que o Dao não precisa de definição, ele deve ser apenas vivido.
Diferentemente das obras religiosas citadas no início, e com todo respeito aos praticantes destas religiões, o Dao De Jing não se limita a contar uma história particular de um povo. O Dao De Jing é uma faca afiada que reto corta sabiamente o ego.
A QUEM SE DESTINA?
O livro será mais bem apreciado por aqueles desapegados de religiões. Em alguns momentos pode se tornar de difícil leitura por causa de sua estrutura versada. Recomendo a leitura apenas dos versos e comentários originais para os leitores mais iniciantes. A leitura em conjunto com as Notas do tradutor talvez seja destinada apenas a leitores mais avançados, ou se você realmente tem a curiosidade em saber as particularidades das diferentes traduções, detalhes do taoísmo e das antigas dinastias chinesas.
pedro@meditecomigo.org
Pedro tem background em tecnologia da informação e é bacharel em fotografia. É astrônomo amador, amante da natureza e aprendiz eterno da espiritualidade. Universalista convicto, é leitor de temas como física quântica, doutrinas orientais, Conscienciologia, ocultismo, cosmogonia, ufologia e meditação.
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